Um conto baseado em factos reais e familiares e nem os nomes poderia manter sob privacidade…
- “Merda!...”
Deu um salto da cama e num virote começou-se a vestir. - “Tenho que me ir já embora. Tenho que ir ter com a minha Deolinda.”
- “Mas Joaquim…”
- “Deixa-te de “mas” mulher. Tenho mesmo que ir.”
O seu ar era de apreensão e consternamento. Como podia estar ali àquela hora?! Mas… e que horas seriam?! Um suor nervoso escorria-lhe pelas rugas que lhe talhava a cara. – “Desculpa, mas tenho a minha Deolinda à minha espera.” - A dupla recorrência à locução “minha” não era em vão: a Deolinda era a sua vida… toda a expressão da sua vida.
- “Oh Joaquim, não vês que…”
Mas Joaquim já não via nada… melhor, ele só via a imagem da sua doce Deolinda. Apesar de ambos já terem entrado no Outono da vida, o tempo não foi impiedoso: ainda mantinham a mesma beleza com que foram agraciados enquanto jovens.
- “Tenho mesmo que ir. Tenho que ir para a minha casa ter com a Deolinda.” - E cada vez que pronunciava no nome dela um brilho especial se acendia naqueles bonitos olhos azuis.
- “Mas querido, esta é a tua casa e eu sou a tua Deolinda, amor!...”
Uma lágrima começara a escorrer pela face daquela mulher. Este episódio era recorrente. Passou-se uma vida inteira e apesar daquela maldita doença (leia-se Alzheimer) o seu marido ainda mantinha a chama que sempre abençoara aquela união e assim, um misto de tristeza e de felicidade, temperava aquela gota que lhe procurava lavar a alma.